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Abra de alguma lucidez audível / o que nem sabe-se por palavras nem / na música caminha, nem o silêncio anuncia-o [...] (J.O.Travanca Rego)

30 outubro, 2010

The Murder of Crows

de Janet Cardiff

26 outubro, 2010

Dos moinhos



(Este foi o meu pequeno contributo para uma exposição dos irmãos Carlos e Pedro Inácio: A alma dos moinhos. O Carlos faz hoje anos, daqui lhe envio um abraço.)




Nasci a ver azenhas junto a cursos de águas. Nunca pensei noutra energia. Só mais tarde, já na adolescência, percebi que para além da água havia o vento e as azenhas tinham o nome de moinhos. Eram outros os lugares, onde o azul marítimo alternava com um nevoeiro tomado à verdura e ao orvalho da manhã. Os meus olhos iam de baixo para cima: um acordar rente à natureza e depois céu.
Visto cá de baixo, o moinho era uma máquina de produzir silêncios. Ao barco terrestre ao longe associava-lhe o cair da farinha, branca como as casas, leve como os dedos moídos de deus. Quem ali habitasse sabia de há muito – pensava – os sons que não eram audíveis por outros mortais. O silêncio não existia. As mós, no seu trabalho circular, devoravam o grão entre os latidos dos cães e o assobio do vento.
O Niassa acompanhava nas subidas. Ladrava sem saber que o ruído era coisa natural. E eu, como Sancho, olhava aquelas máquinas e percebia o medo de um Quixote feito cão. Os moinhos nunca foram casas com gente dentro mas pequenos desertos de farinha nos lugares onde o vento dá.
Os guerreiros que protegem as fronteiras de um país imaginário, vistos das estradas que nos afastam da cidade à velocidade do nosso desejo, colam o olhar às nuvens ou num lugar a habitar: um lugar de esperança, uma casa que se converte em nós em paraíso. Todos sentimos isso.
É semelhante a história dos moinhos e das ermidas: os primeiros vão nascendo por imposição natural, esvaziando a paisagem de ruído e negro enquanto as segundas se dobram, silenciosas e doridas de branco, para a altitude que nos aproxima daqueles que habitam o céu ou a frescura. Tanto faz. O moinho e a ermida fazem parte da mesma arte que torna as paisagens uma pintura connosco dentro.
O Niassa morreu. É dos vivos este destino, talvez o único, dizem. E os moinhos, embora perdendo há muito a sua função, regressam sempre aos olhos e enchem de luz um espaço a habitar, que é o mundo afinal.

16 outubro, 2010

John Lennon




Desconhecia esta fotografia de John Lennon que hoje vejo reproduzida no Expresso. Ela mostra-o a auscultar o mundo. Aquele que foi um dos mais interessantes músicos da década de 60, revolucionando a música através do seu grupo Beatles, abre-se a uma representação de uma cultura que vem emergindo em diferentes áreas do saber humano e em diferentes ofícios. A cultura do som, que não se faz por oposição à cultura visual, tornou-se em poucos anos uma nova forma de conhecimento e, sobretudo, o levantamento das qualidades humanas em escuta.